Uma História Doida Demais

Passava muito das onze horas da tarde. A impressão que se tinha é que quanto mais o tempo passava, mais distante ficava o dia seguinte. Um vento muito forte uivava sobre as colinas e movia lentamente as folhas das árvores.

Era verão. O matagal estava todo coberto de neve quando começou a chover.

Eliane e sua amiga Ana saíram para passear no parque e quase se molharam. Despediram-se e foram juntas tomar um sorvete. Depois foram à praia tomar banho de lua. Mas Ana quase caiu da escada quando entrou na água do mar.

— Eliane, vamos ao restaurante?

Consentindo com a cabeça, Ana respondeu:

— Não, já é muito tarde, a noite se aproxima e temos que conseguir um abrigo, pois os animais da floresta costumam atacar à noite…

Foram ao restaurante.

Quando entraram Ana tropeçou num sapo que estava saindo do local. Depois de xingar a mãe do sapo, Ana matou-o com três tiros no coração. O animal morreu e foi embora.

— Eliana, você tem dinheiro para pagar a conta do jantar?

— Não. Você também não tem dinheiro?

Ninguém tinha dinheiro. Depois de pagar a conta elas foram passear de canoa no rio.

Quando a canoa começou a afunda Ana telefonou para a sua mãe vir busca-la. Pediu a ela que trouxesse uma blusa, porque no ano seguinte poderia esfriar.

Em dado instante elas começaram a rezar, correndo desesperadamente de um lado para o outro da canoa, até que foram salvas por uma forte tempestade que caiu repentinamente, soterrando a embarcação delas.

As duas amigas moram no mesmo bairro, mas em cidades diferentes. Ana está estudando inglês e castelhano, mas Eliane não está estudando. Como elas estão na mesma classe, vão sempre juntas para a escola, conversando sobre suas aventuras na adolescência.

Lembravam-se de fatos sem nenhuma importância histórica, como por exemplo o dia em que a Princesa Isabel as elegeu cidadãs eméritas porque haviam contribuído para a prisão de Tiradentes, acusado por Pedro Álvares Cabral de ter assassinado Abel, filho de Adão e Eva, na Califórnia.

Nas férias escolares elas resolveram fazer uma viagem para o Egito. Saíram um dia antes de decidirem fazer a viagem e, como foram de avião à jato, chegaram dois dias antes de saírem.

Lá o tempo estava bom, com fortes chuvas em toda a região. Elas haviam levado capas de chuva, mas tiveram que vende-las por não precisarem delas.

O dono do hotel onde elas ficaram era francês, mas não sabia falar francês, muito menos português ou qualquer outra língua.

— Quantos dias as senhoritas vão ficar aqui? – perguntou ele.

— Bem — respondeu Eliane — vamos por partes. Primeiro vamos responder quantos dias não vamos ficar aqui. Depois, quantos dias gostaríamos de ficar, mas motivos de força maior não nos permitirão. Depois vamos…

— Pare… pare… — gritou o rapaz — deixa para lá! Não precisa responder mais nada. Não farei mais nenhuma pergunta. Quantos quartos as senhoritas vão querer?

— Vamos ficar oito dias e usar oito quartos.

— Mas vocês são apenas duas…

— Então porque perguntar quantos quartos vamos precisar? É claro que são três, uma em cada quarto.

— Não estou entendendo — falou o dono do hotel.

— É simples, cada uma ficará no quarto que a outra não estiver.

— Ah, bom!

Elas ficaram no mesmo quarto.

No dia seguinte as duas foram visitar as pirâmides, mas o porteiro não as deixou entrar. Estava havendo uma greve dos trabalhadores egípcios contra o aumento de salário que o Faraó Ramsés havia lhes dado.

Eles acharam demais o aumento pois isso poderia prejudicar a economia nacional. E, por coincidência, a chefe da revolução era uma mulher chamada Eliane.

— Como é o seu nome, moça?

Era um soldado do Faraó que as abordara.

— Primeiro fale o seu!

Essa atitude de Ana custou-lhes a liberdade. Na delegacia da mulher confundiram Eliane com a chefe da revolução. Só que, por uma ironia do destino, os rebeldes venceram e tomaram o poder, quando a chefe da revolução foi eleita rainha.

Mas a verdadeira Eliane morreu no anonimato, atropelada por um helicóptero que velejava no mar morto. E a Eliane da nossa história assumiu o trono.

— Minhas primeiras medidas serão estas: Vou aumentar terrivelmente os impostos, mandarei matar até os filhos do Faraó que ainda não nasceram, abaixarei os salários até perto de zero, desabolirei a escravatura e a lei do ventre livre…

O povo vibrava de alegria. Eliane continuou:

— Vou por um ponto final na aposentadoria e nas forças armadas. Vou desativar a polícia, vou instituir a pena de morte e dar mais margem ao crime, em resumo, vou bagunçar o coreto nesse horroroso país.

Era a glória. O povo, que realmente gostava de bagunça, encontrou a governante que pediu a Deus pelo correr dos séculos.

— Vou mandar demolir todas as escolas, praças e companhias de água, luz e telefone. Vamos voltar à idade da pedra!

O povo chorava de alegria. E Eliane não parava por aí:

— Vou mandar instalar uma forca em cada esquina. Vou conceder verbas ao sindicato das bruxas. Mandarei soltar todos os bandidos, vou ajuda-los com verbas altíssimas para bem cumprirem a árdua missão de acabar com a paz do povo, que tanto necessita de sofrer para se purificar, para se tornar um povo menos culto, mais voltado para o tempo das cavernas, onde, desprotegido, o ser humano era atacado por animais pré-históricos que os despedaçavam sem cerimônias. Como hoje em dia não existem mais tais animais por aqui, vou mandar exportar da lua!

Não precisava dizer mais nada. Eliane cativara completamente a simpatia daquele povo tão antipático, tão carente de aventuras e desventuras.

— Vou por fogo no país!

No dia seguinte eles receberam a visita do presidente de um país vizinho, que ainda não sabia dos últimos acontecimentos por aqueles lados, e ele foi o escolhido para inaugurar a forca da esquina do palácio. E foi aquela festa.

As olímpiadas haviam sido previstas para acontecer ali naquele ano e foram chegando atletas do mundo inteiro. Mas, à medida que chegavam, iam inaugurando novas forcas, que se encontravam por todo o país.

Então, o que já era previsível aconteceu. Estourou uma grande guerra mundial. Ou melhor, todos os países do mundo estavam contra eles, por haverem enforcado pessoas inocentes sem nenhum julgamento.

Eliane precisou então abdicar do poder e fugir às pressas daquele lugar. Como ela havia se apaixonado pelo Faraó Ramsés, levaram-no com elas na fuga, já que ele estava louco para conhecer a Brasil, Lampião e seus capangas e o presidente da república.

O dia não inesperado do casamento chegou. Ana, que era filha de Bartolomeu Bueno da Silva, que compôs a letra do hino nacional da Bulgária, foi a madrinha do casamento. Apareceu na igreja vestida de luto, com uma faca na mão, atitude muito repudiada por sua mãe, Elizabeth Taylor, que trabalhou nas novelas ‘Coração Calado’ e ‘Selva de Pedregulho’, ao lado de Vitor Hugo, que escreveu os romances ‘Coração de Cacos de Vidro’ e ‘Éramos Meia Dúzia’.

Como ninguém sabia o motivo dessa estranha atitude de Ana, pensaram que talvez ela fosse, por ciúmes, assassinar Eliane ou o Faraó, ou o padre, que se chamava Anchieta, famoso por participar das filmagens da ‘Escolinha do Professor Imundo’, como diretor coadjuvante.

Eliane, com medo de ver o noivo se transformar em múmia antes da hora, começou a gritar. E o povo começou a correr de um lado para o outro, até derrubarem todas as paredes da igreja.

Os jornais noticiaram o fato como se fosse grave: Trem de ferro descarrilhado derruba igreja.

Ana, culpada por tudo, fugiu para a casa de seu bisavô, Leonardo da Trinta, famoso por ter composto mais de 350 mil músicas, entre elas ‘Danúbio Cor de Abóbora’, ‘Tio, como te Amo’, ‘Salve o Corinthians’ e outras piores.

Na casa dele Ana teve tempo de se dedicar às letras, quando escreveu o livro ‘Os Suicíadas’, que depois virou novela de televisão.

Depois de alguns anos Ana voltou à cena do crime, pensando já haver terminado o tumulto, e viu Eliane entrando novamente na igreja, vestida de noiva.

Dessa vez Eliane pensava que tudo iria correr bem, mas Ana chegou na porta da igreja e foi abordada por um indivíduo que anunciou: ‘Isto é um assalto, não faça nenhum barulho’.

Desesperada, Ana tomou a arma do ladrão e entrou gritando na igreja.

Precisou de 35 viaturas da polícia para levar em cana todos os envolvidos naquilo que se tornou uma calamidade pública, pior do que qualquer guerra mundial. Por esse motivo, Ana, Eliane e Ramsés foram exilados.

Na floresta que eles foram morar, no meio da Ilha das Benvinas, havia uma família de anões. Construíram uma cabana ao lado da deles e pensaram que ali poderiam viver em paz.

Pensaram, mas erraram.

Os anões, muito malvados, viviam jogando pedras na janela dos exilados. Por isso, numa noite escura de lua cheia, Ana resolveu incendiar a cabana dos anões.

Só que aconteceu algo imprevisto: o fogo se alastrou para a cabana deles e logo para toda a ilha, incendiando até uma parte do mar.

Acontece que dessa vez a culpa do incidente caiu sobre os anões, que por castigo foram escravizados pelos índios da região até o fim de suas vidas.

COMEÇO DO EPÍLOGO

Vou descrever agora os últimos acontecimentos na vida de Ana, Eliane e do milenar Faraó.

Ana plantou no jardim de sua nova casa bananas e rosas. No quintal havia nascido um pé de vento e já estava dando flor.

Na frente da casa havia um campo de futebol, com um poço bem no meio do campo. Os índios tinham um escritório de contabilidade num num prédio de 18 andares localizado num porão ao lado do campo.

Era festa de aniversário de Eliane, que completava naquele dia 25 anos, 8 meses e 4 dias.

— Vamos entrando, que bom que vocês vieram, que bom!

A festa estava boa, até que um indivíduo de aparência esquizofrênica se embebedou a ponto de não saber mais o que falava e fazia. Não foi difícil para ele provocar uma briga no meio da festa.

Eliane e Ana saíram da casa, trancaram as portas por fora e colocaram fogo no local, mantando todos os convidados. Mas só depois se lembraram que o Faraó ficou lá dentro.

Era tarde demais. Quando o fogo se extinguiu elas descobriram que nem para múmia o que sobrou serviria. Foi muito triste para elas.

Parece que por castigo naquele mesmo dia ambas foram mordidas por uma cobra. O veneno funcionou como afrodisíaco e as duas se apaixonaram loucamente.

Foram então embora daquele local, pegando a Rodovia Costela Branca, que as levou diretamente ao Jardim do Éden, onde plantaram macieiras e pés de cobra.

Vivam em completo pecado naquele lugar paradisíaco até que…

FIM DO EPÍLOGO

Até que elas foram sequestradas por um maníaco que as prendeu numa sala confortável e as obrigou a assistir um programa do Sílvio Demônios inteirinho.

Elas se suicidaram, loucas de tédio e desgosto.

Sérgio Montiel Leal

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